segunda-feira, 14 de julho de 2008

Quique Flores: 4x2x3x1 ou 4x4x2?

Após a primeira semana de trabalho no Seixal, mantém-se a expectativa em relação a novos reforços e aumenta a incerteza quanto a possíveis dispensados. Alguns exemplos: a "novela" Aimar tarda em chegar ao último capítulo; Codina encontra-se em stand-bye; Fábio Coentrão é emprestado ao Feyenoord, com a opção de compra avaliada em 5 milhões de euros; e, o Mónaco sonda a possibilidade de contar com Freddy Adu. Para além destes casos, o uruguaio Urretavizcaya e o argelino Hadj Aïssa tentam evidenciar-se e diversos jovens, vindos da formação, procuram conquistar o seu espaço. Por fim, acrescente-se o facto de só mais tarde os internacionais juntarem-se ao grupo. Neste momento, apenas uma certeza: Quique Flores pretende um plantel constituído por 25 jogadores. O resto é um mero exercício de especulação.

Quique Flores: 4x2x3x1 ou 4x4x2?

Se quanto às caras, que vão compor a fotografia, as dúvidas persistem, quanto ao sistema táctico já se vislumbram algumas novidades. O treinador espanhol tem procurado treinar o 4-4-2 com a utilização de médios-ala. Espera-se, portanto, que o desenho se aproxime do modelo clássico, existindo a alternativa de um 4x2x3x1 mais defensivo e conservador. Em termos de princípios de jogo, também é visível que Quique Flores pretende utilizar a defesa em linha, explorando a técnica do fora-de-jogo. A pergunta que se coloca é: será este o esquema principal? Haverá espaço para o 4x3x3 ou para o 4x4x2 losango?

A experiência em Valência

Para responder a estas questões, nada como recuar até à época 2005/06. Vindo do Getafe, o actual treinador do Benfica chega a Valência com a missão de substituir Claudio Ranieri. Apesar das naturais diferenças quanto à realidade específica que rodeia ambos os clubes, resulta interessante conhecer qual a abordagem inicial protagonizada por Quique Flores. Mesmo que as circunstâncias sejam distintas e a história não se repita, uma coisa é certa: as ideias e convicções do homem forte encarnado não devem ser muito díspares. Vamos, então, analisar os seus primeiros passos, como forma de extrapolar o seu pensamento táctico para o futuro benfiquista.

Revolução - parte II?

Em primeiro lugar, o início de temporada foi marcado por uma autêntica revolução: cerca de duas dezenas de saídas e perto de quinze entradas. Só para citar alguns exemplos, saliente-se os empréstimos de Caneira, ao Sporting, e David Silva, ao Celta de Vigo, assim como as contratações de David Villa (Zaragoza), Patrick Kluivert (Newcastle) e Raúl Albiol (Getafe). Tal corropio de jogadores não impediu a implementação de um modelo de jogo consistente, baseado num grupo sólido. A prova disso mesmo é que o Valência alcançou o 3.º lugar na liga espanhola, atrás de Barcelona (campeão) e a um ponto do Real Madrid. Pelas indicações dos últimos dias, o futebol do Benfica será marcado, concerteza, sob o signo de uma revolução, mais ou menos, acentuada.

Valência 1-0 Real Bétis

27 de Agosto de 2005. Primeira jornada da liga espanhola. O Valência recebe o Real Bétis no Mestalla e vence pela margem mínima. Golo marcado por...Pablo Aimar, aos 53’ minutos. O primeiro onze titular segue os preceitos do 4x2x3x1: Cañizares (GR), R. Albiol (DD), Ayala (DC), Moretti (DC), F. Aurélio (DE), Albelda (MC), Baraja (MC), Rufete (MD/MOD), Vicente (ME/MOE), P. Aimar (MO) e Mista (PL). Curiosamente, vale a pena analisar as substituições realizadas por Quique Flores: (i) aos 62’ minutos (pouco depois do golo que garantiu a vitória), Mista dá o lugar a Patrick Kluivert; (ii) aos 81’ minutos, Marchena substitui Rufete; e (iii) aos 87’ minutos, P. Aimar troca com D. Villa. Conclusões? Talvez por ter sido o jogo inaugural, houve o cuidado de refrescar o ataque, num primeiro momento, e preencher a zona defensiva com a entrada de Marchena, aquando da segunda substituição.

Zaragoza 2-2 Valência

11 de Setembro de 2005. Segunda jornada da liga espanhola. O Valência desloca-se ao terreno do Zaragoza e empata a duas bolas. Golos marcados por Angulo e D. Villa. Primeira alteração a merecer destaque: Quique Flores passa do 4x2x3x1 para o 4x4x2 clássico. Onze titular da altura: Cañizares (GR), R. Albiol (DD), Ayala (DC), Moretti (DC), F. Aurélio (DE), Albelda (MC), Baraja (MC), Rufete (MD), Angulo (ME), Di Vaio (PL) e Mista (PL). Na segunda parte, a perder por 2-1, o treinador espanhol regressa ao 4x2x3x1: Vicente, mais incisivo, substitui Angulo e P. Aimar, entre linhas, troca com Di Vaio. Na frente, Mista coloca-se em cunha entre os centrais contrários. Aos 80’ minutos, nova jogada de risco: sai Baraja (MC) e entra D. Villa (PL). O Valência desenha um losango a toda a largura do relvado e o golo do empate surge um minuto depois, por intermédio de...D. Villa.

Barcelona 2-2 Valência

Depois de na 3.ª jornada registar-se novo empate a duas bolas, na recepção frente ao Deportivo, a 21 de Setembro dá-se o primeiro grande teste: visita a Camp Nou, para defrontar o Barcelona. Mais uma vez, 2-2 foi o resultado final. Quique Flores explanou a equipa titular em 4x2x3x1: Cañizares (GR), Caneira (DD), Ayala (DC), Marchena (DC), Moretti (DE), Albelda (MC), F. aurélio (MC), Rufete (MD/MAD), Vicente (ME/MAE), P. Aimar (MO) e D. Villa (PL). Aos 54’ minutos, o Valência vencia por 2-1, com golos da nova coqueluche: o espanhol D. Villa. Ao contrário do que se faria supor, o novo treinado encarnado não defendeu a margem mínima, pois Hugo Viana entrou para o lugar de F. Aurélio (na zona do meio-campo) e P. Aimar deu a sua vez ao ponta-de-lança Mista. Já agora, o golo do empate foi obtido por Deco aos 80’ minutos.

[Valência] Sistema(s) táctico(s): resumo

Ao longo de toda a prova caseira, o 4x2x3x1 foi o esquema mais utilizado, alternando, ocasionalmente, com o 4x4x2 clássico. Da análise efectuada, sublinhe-se ainda duas particularidades que ajudam a conhecer o pensamento táctico/estratégico de Quique Flores: (i) quando em desvantagem no marcador, a aposta recaía na saída de um médio centro (MC), pela respectiva entrada de um ponta-de-lança (PL), desenhando-se assim um 4x4x2 losango com alas e suportado por um único pivot defensivo; e (ii) quando em vantagem, era comum observar-se a entrada de mais um defesa central (DC), como forma de proteger a zona mais recuada, transformando o esquema táctico em algo parecido com o 5x4x1, assente num bloco médio-baixo.

[SL Benfica] Sistema(s) táctico(s): suposições

Depois deste breve exercício, estamos em melhores condições para prever a forma como Quique Flores irá moldar o novo Benfica. À partida, até pelas características dos jogadores, é passível que o 4x2x3x1 seja o sistema táctico mais natural. A grande dúvida reside no posicionamento e interligação entre os homens do meio-campo. Por exemplo, não existem certezas quanto à coexistência de médios-ala (extremos) como Di María e Javier Balboa, porque Sepsi ou Jorge Ribeiro, na esquerda, podem actuar com funções mais defensivas e Maxi Pereira pode desempenhar o mesmo papel do lado contrário.
Também não é a mesma coisa jogar com duplo pivot defensivo, ou com um médio centro mais recuado (Petit?) e outro mais de transição (Carlos Martins?). Neste caso, vamos dar nomes às palavras. Cenário 1: imaginem um meio-campo com Petit e Katsouranis (ou Fellipe Bastos) e Pablo Aimar na posição de n.º 10. Estaríamos perante um triângulo suportado por dois n.º 6, de características vincadas na marcação e recuperação. Cenário 2: imaginem, agora, um meio-campo composto por Petit (ou outro) e Ruben Amorim (ou Hassan Yebda), com Pablo Aimar (ou Carlos Martins e Freddy Adu) uns metros à frente. O triângulo ganha inclinação com a entrada de um n.º8, jogador mais participativo nas transições.

A hipótese do 4x4x2 losango

Mesmo sabendo que o Benfica dispõe de alguns atletas que podem desequilibrar junto às faixas, a vinda (ou não) de Pablo Aimar quase que exigia um 4x4x2 losango. Até pelas diversas alternativas disponíveis no plantel, que se pretende homogéneo. Para finalizar, atente-se nas diversas variantes possíveis: vértice recuado, Petit (Fellipe Bastos/Ruben Amorim); vértice direito, Katsouranis (Rubem Amorim/Hassan Yebda); vértice esquerdo, Carlos Martins (Jorge Ribeiro); e, vértice ofensivo, Pablo Aimar (Carlos Martins/Freddy Adu). Escolhas para todos os gostos.

Apesar de extenso, espero que este artigo tenha ajudado a perceber algumas das ideias tácticas de Quique Flores e principais vicissitudes do modelo de jogo, consoante o sistema utilizado.

8 comentários:

Palhacito disse...

A expectativa que eu tinha era mesmo a de o Quique Flores pretender jogar num 4-4-2 clássico, com os alas abertos, alternando com o tal 4-2-3-1 mais defensivo. Mas, neste momento, parece-me que o Benfica não tem jogadores para jogar no 4-4-2 clássico, porque faltam alas (temos o Dí Maria e o Balboa e mais ninguém). E também para o 4-2-3-1 me parece que faltam peças: para jogar no trio mais ofensivo do meio campo estão disponíveis Dí Maria, Balboa, Nuno Assis (será que fica no plantel?), André Carvalhas (será que vão apostar nele?), Adu (será que fica?), Carlos Martins (joga melhor vindo de trás) e as possibilidades Aimar e Aïssa - como, destes jogadores, apenas 3 são actualmente certezas no plantel, parece-me de facto que não há (ou poderemos ficar sem) opções para jogar neste esquema.

Parece-me que o 4-4-2 losango poderia ser uma boa aposta; primeiro porque temos vários jogadores (e de boa qualidade) para preencher o meio campo: Petit, Katsouranis, Binya, Fellipe Bastos, Yebda ou Rúben Amorim para o papel de pivot defensivo; Katsouranis, Rúben Amorim, Carlos Martins, Yebda, Maxi Pereira, Jorge Ribeiro para o papel de interiores; Adu, Carlos Martins, Nuno Assis, Aimar (?), Dí Maria, Aïssa (?) para jogar nas costas dos 2 avançados).
Pessoalmente aprecio o 4-4-2 losango, mas tenho a consciência de que são necessárias duas coisas: (1) rotina na táctica e compensações bem ensaiadas e (2) jogadores inteligentes. A aposta que o Fernando Santos fez neste esquema, aquando da passagem pelo Benfica registou altos e baixos mas quer-me parecer que neste momento temos (mais e melhores) jogadores melhor adaptáveis a este esquema e que poderia realmente ser uma aposta... e se calhar um esquema mais ajustado ao plantel que apresentamos neste momento.

AK 47 disse...

Boas.
Optima análise. Quanto a mim a minha principal preocupação prende-se com as alternativas apresentadas para o ataque.
Porque pelo andar da carruagem, ou muito me engano, e o Rui Costa traz o Aimar, ou teremos obrigatóriamente de assumir o Adu como uma aposta. Não me parece que tenhamos soluções para as alas...nem esquerda nem dtaª.
Esta indecisão e falta de capacidade aparente de contratar bons jogadores, preocupa-me bastante.
Espero estar enganado e que o atraso que todas estas contratações estão a ter não tenha qualquer importância.
Mais do que ver grandes nomes, gostava sim de ver uma estratégia e um rumo tomado. Porque segundo o que sei só o Yebda veio Supostamente com o AvAL do treinador....que raio de equipa se faz assim?
Cpts

Catenaccio disse...

À partida, pelas soluções no meio-campo, o ideal seria o Benfica actuar em 4x4x2 losango.

Vários cenários se poderiam colocar: (i) Petit, Katsouranis (Hassan ebda), Carlos Martins, Pablo Aimar; e, (ii) Fellipe Bastos, Ruben Amorim, Jorge Ribeiro, Freddy Adu (Di María). Serve como exemplo...

Talvez o facto de jogadores como Fábio Coentrão e André Carvalhas terem sido emprestados aponte para este sistema. Contudo, Di María e Javier Balboa (médios-ala/extremos) perderiam lugar.

Outra hipótese, provavelmente a mais plausível, seja a implementação do 4x2x3x1, com Pablo Aimar a n.º 10 e Cardozo na frente. Neste caso, Nuno Gomes ficaria no banco e a concorrência para o duplo pivot defensivo seria acesa.

Agradeço os comentários. Continuem...

Anónimo disse...

Não concordo que o 4x5x1 seja o sistema mais natural, como tive oportunidade de "sonhar" aqui.
Cumprimentos, JJ Aquilino Pires

Nuno disse...

Só um reparo. Se bem me lembro, o Aimar com o Quique raramente jogou como médio. A equipa mantinha-se em 442 clássico com ele, e ele jogava ao lado do avançado. E fez uma época bem abaixo das suas possibilidade por causa disto...

Catenaccio disse...

Sim, pelo que já tive oportunidade de pesquisar, o Pablito tanto jogava a n.º 10, num sistema de 4x2x3x1, como mais avançado, junto ao ponta-de-lança, num 4x4x1x1.

A verdade é que há vários cenários e soluções. Também depende das contratações que ainda forem feitas. Eu apenas centrei a minha análise nos primeiros tempos de Quique Flores no Valência, na época 2005/06 e observei alguns dos sistemas mais utilizados.

Puskas disse...

Consideras impossível a utilização conjunta, do Cardozo com o Suazo?

É verdade que o Cardozo requer cruzamentos, e por isso temos que jogar mais abertos nas alas... o Suazo, necessita de espaço, por isso
é mais indicado para quando estamos com o bloco mais requado e aproveitamos a subida da defesa adversária.

Mas, não haverá uma forma de compatibilidade? Pergunto eu.

Sei, que à primeira vista parece, pouco possível... mas enquanto não for testado, não podemos ter certezas de nada. (testado, certamente que já foi nos treinos, mas nós jogos, onde eu possa ter visto, ainda não)

Catenaccio disse...

Puskas,

Pelo contrário. Aliás, ontem ficou provado que é possível haver complementaridade com dois avançados altos e poderosos fisicamente. Estou a falar do Bayern de Munique e de Miroslav Klose e Luca Toni.

Portanto, nem sempre deve ser considerado que uma dupla só será eficaz com um ponta-de-lança alto e tosco e outro baixinho e habilidoso. Penso, sinceramente, que já era altura de apostar em Cardozo do Suazo, para garantir mais pressão na área adversária. E, neste caso, porque não falar em complementaridade? Um é lento, mas domina o espaço aéreo e remata com força e colocação (Cardozo): o outro tem como arma a velocidade, a mobilidade, o sentido de desmarcação (Suazo).

Cumprimentos.